Um pedido de destaque do ministro Alexandre de Moraes interrompeu, na última sexta-feira, o julgamento do Plenário do Supremo Tribunal Federal sobre a possibilidade de suspensão de serviços de mensagem, como o WhatsApp, por descumprimento de ordens judiciais.
Com isso, a análise do caso será reiniciada em sessão presencial, ainda sem data marcada. Até o pedido de destaque, o julgamento era virtual, com término previsto para a próxima sexta-feira, 29/9. A relatora, ministra Rosa Weber, foi a única a votar.
Histórico
A Ação Direta de Inconstitucionalidade foi proposta em 2016 pelo então Partido da República, hoje Partido Liberal (PL), para contestar dispositivos do Marco Civil da Internet. A legenda pediu a inconstitucionalidade da penalidade de suspensão temporária dos aplicativos de mensagem, devido à função social desse tipo de serviço.
Um dos dispositivos questionados é o parágrafo 2º do artigo 10, segundo o qual o conteúdo de comunicações privadas “somente poderá ser disponibilizado mediante ordem judicial”. Os demais são os incisos III e IV do artigo 12, que preveem a suspensão temporária e a proibição do exercício das atividades de empresas que desrespeitem a lei e os direitos à privacidade.
Tais trechos do Marco Civil serviram para fundamentar decisões que determinaram o acesso a trocas de mensagens e ordens judiciais que suspenderam o WhatsApp em todo o Brasil.
Em maio de 2016, a Vara Criminal de Lagarto (SE) determinou que as operadoras de telefonia fixa e móvel bloqueassem o aplicativo por 72 horas. Isso porque a empresa não havia cumprido uma ordem judicial anterior para fornecimento do conteúdo de conversas relacionadas a uma investigação policial. Mais tarde, o bloqueio foi revertido pelo Tribunal de Justiça de Sergipe.
Em julho daquele mesmo ano, a 2ª Vara Criminal de Duque de Caxias (RJ) determinou mais uma vez a suspensão do WhatsApp. A ordem foi derrubada pelo ministro Ricardo Lewandowski, à época presidente do STF. A ação que discute se a decisão de primeiro grau violou a liberdade de comunicação (ADPF 403) ainda tramita na Corte Constitucional.
Em 2020, quando apresentou seu voto, Rosa Weber validou os dispositivos do Marco Civil contestados, mas se posicionou contra a suspensão dos aplicativos de mensagem por ordens judiciais — ou qualquer decisão que possa enfraquecer a proteção criptográfica.
Mas a atual presidente do STF fez uma ressalva. Para ela, é possível que o Judiciário determine a disponibilização do conteúdo de conversas ou registros de conexão e de acesso para ajudar investigações criminais. Ela lembrou que a Constituição autoriza a suspensão do sigilo de comunicações privadas somente em caso de persecução penal.
A magistrada também ressaltou a possibilidade de suspensão temporária ou a proibição de atividades específicas das empresas: as que envolvem coleta, armazenamento, guarda e tratamento de registros, dados pessoais e comunicações privadas. As sanções podem ser aplicadas em caso de descumprimento da legislação e dos direitos à privacidade, à proteção de dados pessoais e ao sigilo das comunicações.
Segundo a relatora, as ordens judiciais de bloqueio do WhatsApp ocorreram devido à “invocação indevida” do Marco Civil da Internet para a “prática de atos que não são por ele amparados“.
Na visão de Rosa, o poder do Estado em ordenar a disponibilização de mensagens em investigações criminais não torna ilegal o serviço com criptografia — tecnologia que não permite à própria plataforma acessar tais conteúdos.
Se o provedor dos serviços desenvolve e adota a criptografia para garantir a privacidade das conversas, “não pode o Estado compeli-lo a oferecer um serviço menos seguro e vulnerável, sob o pretexto de que pode vir, eventualmente, a utilizar essa vulnerabilidade artificial, para cumprir ordem judicial a respeito“. Isso seria equivalente a proibir tal tecnologia e privilegiar a exceção (acesso do Estado a conteúdos privados) à regra (sigilo das comunicações).
Fonte: Conjur